Debit Suisse? Entenda a crise do Credit Suisse
Nos últimos dias, a crise de confiança sobre o Credit Suisse escalou significativamente e investidores passaram a debater sobre a possibilidade de falência do segundo maior banco da Suíça e um dos maiores do mundo.
Dois eventos marcantes desencadearam a crise: o primeiro foi o colapso da britânica Greensill, que emprestava dinheiro para empresas pagarem seus fornecedores e securitizava as dívidas em títulos financeiros para revender a investidores. Ao declarar falência em março de 2021, a Greensill levou junto US$ 10 bilhões de clientes do Credit Suisse.
O segundo escândalo envolveu o family office Archegos Capital Management, que através de grandes empréstimos de bancos, inclusive do Credit Suisse, investiu pesadamente na ViacomCBS. Com a queda das ações, a Archegos não conseguiu cobrir as perdas ligadas aos financiamentos e faliu, totalizando US$ 5,1 bilhões de prejuízo ao Credit Suisse.
Uma investigação independente do banco concluiu que houve falhas na gestão de riscos e ao menos nove executivos do CS foram demitidos. Depois disso, o Credit Suisse entrou em uma sucessão de instabilidades e anunciou a demissão de cerca de 10% de seus funcionários.
Em uma tentativa de transmitir estabilidade, o diretor executivo do banco, Ulrich Körner, afirmou em um memorando interno que o Credit Suisse tem “fortes bases de capital e boa posição de liquidez”, apesar de afirmar que a instituição vive um “momento crítico”.
O Credit Suisse também informou que até o dia 27 de outubro (quando divulga seus resultados), deve anunciar uma reestruturação para corte de custos que deve incluir a redução do banco de investimentos e, possivelmente, a repartição da instituição em três frentes. Especula-se que os cortes podem superar US$ 1,5 bilhão e há conversas de que o banco suíço venderá ativos.
Apesar dos esforços da instituição de acalmar o mercado, somente em setembro os papéis do Credit Suisse caíram 24% e os investidores seguiram exigindo prêmios maiores para aportar no Credit Suisse, sinalizado pelos spreads do Credit Default Swap (CDS, derivativo financeiro que indica o risco de crédito) que disparou ao maior patamar desde 2009 e está próximo a superar os níveis vistos durante a crise de 2008. Agora, o CDS indica que o mercado vê a probabilidade de default (inadimplência) nos próximos cinco anos é de mais de 21%.
Spread do CDS do Credit Suisse
Os rumores se espalharam rapidamente, Credit Suisse tornou-se trending topics no twitter, apelidos como “Debit Suisse” foram criados e investidores pessoa física especularam no Reddit se o Credit Suisse poderia ser o próximo Lehman Brothers (o banco de investimento dos EUA que entrou em colapso em 2008), o que somente aumentou a força vendedora dos papéis.
Isso reforça o potencial de influência que os fóruns online podem exercer agora sobre os mercados financeiros – quase dois anos depois que investidores pessoa física se uniram nas redes sociais para impulsionar as ações da GameStop e da IRB, no Brasil.
Leia também: Short Squeeze: Entenda a especulação que esmagou os mercados
O pânico foi refletido nos preços das ações, que chegaram a cair 12% em Zurique na segunda-feira (3/10), superando um recorde de baixa intradiária e negociando abaixo do valor contábil. O valor dos títulos de maior risco do banco caiu drasticamente e o custo de garantia da dívida do Credit Suisse contra inadimplência aumentou.
Em um ano, a capitalização de mercado do Credit Suisse saiu de quase US$ 30 bi para US$ 10 bilhões. A título de comparação, o Nubank vale US$ 22 bilhões na Bolsa de Nova York.
Preço dos papéis do CS negociados na NYSE
Depois de bater na mínima histórica, os ânimos se acalmaram e as ações do Credit Suisse negociadas na NYSE recuperaram 12% na terça-feira. Na última sexta-feira (7/10) o Credit Suisse anunciou planos de recomprar o equivalente a cerca de 3 bilhões de francos suíços em bônus de sua emissão para economizar em pagamentos de juros, num momento em que o banco suíço se prepara para reestruturar suas operações, o que ajudou os papéis a fecharem com 13% de alta. De qualquer forma, no acumulado do ano os papéis do CS têm 50% de perdas.
Alguns gestores falam em exagero do mercado, mas muitos defendem que o temor é válido. Segundo cálculos de analistas entrevistados pelo The Wall Street Journal, o Credit Suisse tem de levantar de US$ 4 bilhões a US$ 6 bilhões para se recuperar, e que a exposição à alavancagem da instituição suíça era, no fim de junho, de cerca de US$ 873 bilhões.
Do outro lado, o JP Morgan afirmou que via a “posição de capital e liquidez do Credit Suisse como saudáveis”, analistas do Citigroup disseram que “não se trata de outro 2008” e a Swissquote defendeu que o banco é “grande demais para quebrar” e que em último caso o governo da Suíça poderia intervir para salvá-lo. É até interessante fazermos a conexão com os vencedores do Nobel de economia deste ano, Ben Bernanke, Douglas Diamond e Philip Dybvig, que estudaram o papel fundamental dos governos ao socorrer bancos para impedir o colapso generalizado da economia.
O Citi também afirmou que a liquidez do banco suíço é relativamente saudável, mas que o grande problema está no aumento nos spreads de crédito, que elevam os custos de financiamento.
Um indicador que apoia a capacidade do CS de evitar inadimplência é o seu CET1 (Common Equity Tier 1), que compara o capital líquido (caixa + ações) versus ativos, e que atualmente é de 13,1% (bem acima do mínimo regulatório de 9,6%).
Capacidade total de absorção de perdas
Impacto no mercado brasileiro
Atualmente o Credit Suisse realiza a gestão de oito fundos no Brasil por meio da Credit Suisse Hedging-Griffo, ou CSHG.
- CSHG Real Estate FII (HGRE11)
- CSHG Logística FII (HGLG11)
- CSGH Recebíveis Imobiliários FII (HGCR11)
- CSHG Imobiliário FOF FII (HGFF11)
- CSHG Renda Urbana FII (HGRU11)
- CSHG Residencial FII (HGRS11)
- Castello Branco Office Park FII (CBOP11)
- CSHG Prime Offices FII (HGPO11)
Segundo a gestora, “os fundos não são impactados por quaisquer alterações ou oscilações no valor das ações ou dos títulos de emissão do Grupo CS”. Mesmo assim, os resgates em fundos do Credit Suisse aumentaram mais de 10 vezes com a crise e entre os dias 3 e 5 de outubro, o CSHG DI MASTER sofreu de saques bilionários.
Além disso, apesar do fato de os imóveis dos fundos imobiliários pertencerem aos cotistas, em meio ao pânico da semana passada inflado nos fóruns online, muitos investidores, em sua maioria pessoas físicas, venderam suas posições, o que derrubou os preços dos ativos, como uma profecia auto realizável.
Veja também: Finanças comportamentais: Você investe de forma racional?
Gráfico do FII HGRE11
Caos Global
A turbulência do Credit Suisse foi um caos adicional aos mercados globais, que só no mês passado viram o valor da libra esterlina despencar, autoridades no Japão e na China entraram em ação para defender suas moedas em dificuldade e o mercado de previdência do Reino Unido quase quebrou com a elevação dos preços dos títulos.
Saiba mais: Para inglês ver: entenda a queda da libra esterlina
Alguns investidores temiam que o Credit Suisse pudesse representar a última rachadura no mercado. “A incerteza constante que os investidores experimentaram nos últimos dois anos abriu a possibilidade de que qualquer coisa pode quebrar”, disse Peter Atwater, presidente da Financial Insyghts e professor adjunto da William & Mary, que analisa o grau de confiança dos investidores. Atwater disse que o baixo nível de confiança dos investidores, somado às ações e títulos em queda, alimentaram um “pensamento catastrófico”.
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